Agro desafia o pessimismo – Editorial O Estado de S.Paulo
Para que a competência do setor prolifere, é preciso remover as barreiras à sua expansão
Em meio a um cenário global de inflação, desaceleração econômica e rupturas nas cadeias de distribuição, o setor mais inovador e produtivo da economia nacional segue desafiando o pessimismo. Mesmo com a perspectiva de queda nos preços internacionais das commodities agrícolas, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revisou a alta do PIB agropecuário de 10,9% para 11,6%, puxada sobretudo pela soja, que deve ter alta de 22,5%.
Em meados do século passado o País crescia, enquanto a agropecuária estava estagnada e o Brasil dependia de importações. Nos anos 70 a produção rural acompanhou o processo geral. De lá para cá a situação se inverteu. Hoje, o Brasil é o segundo maior exportador mundial de alimentos, as safras seguem batendo recordes, mas a economia nacional acumula décadas “perdidas”.
O País se encontra em uma nova encruzilhada histórica. O agro pode ser tragado pela mediocridade econômica nacional ou servir de alavanca, com seus exemplos de competência, tecnologia, conhecimento e seriedade, para revertê-la. Para tanto, é preciso garantir as condições de continuidade dessa história de sucesso. Isso não significa que não haja grandes desafios. Ao contrário. É preciso remover barreiras à sua expansão e fortalecer as boas práticas para energizá-la.
Do ponto de vista estrutural, já passou da hora de enfrentar o grande gargalo do agro, a infraestrutura. O crescimento da produção não foi acompanhado, sobretudo no Centro-Oeste, Norte e Nordeste, de melhorias na logística, armazenagem e comunicação.
O governo também precisará ampliar o financiamento rural em suas várias modalidades, tanto mais numa conjuntura de juros altos combinados a um aumento nos preços dos insumos. Ante as intempéries climáticas, um olhar cuidadoso ao seguro rural é crucial.
No plano internacional, é preciso despoluir a reputação nacional após a razia antiambientalista de Jair Bolsonaro, mas, acima de tudo, resistir à onda protecionista nos países desenvolvidos e abrir novos mercados nos emergentes. Além da diplomacia, isso exigirá esforços em duas frentes: uma melhor comunicação das práticas sustentáveis que vêm sendo implementadas pela grande maioria dos produtores e a repressão aos crimes perpetrados por uma minoria iníqua. Além dos ganhos ao meio ambiente, isso desmoralizará os pretextos protecionistas.
Condicionar taxas de juros reduzidas do Plano Safra à responsabilidade ambiental e social é um bom caminho, seja pelo impacto nessas áreas, seja pela visibilidade internacional que isso traz. Com as contas públicas apertadas, isso ajudará a atrair recursos externos.
O próprio presidente eleito Lula da Silva e seus correligionários, por sua vez, precisam expurgar velhos preconceitos ideológicos que tantas vezes difamaram os produtores agrícolas como vilões sociais e ambientais. Se hoje há “latifúndios improdutivos”, eles estão muito menos no campo do que em Brasília e em enclaves corporativos privilegiados por ela. São eles que precisam ser invadidos pelos exemplos de produtividade e sustentabilidade do agro (O Estado de S.Paulo, 3/1/23)