Atraso de entrega de máquinas para produtores cria gargalo no campo
Legenda: Endrigo Dalcin, produtor de soja em Nova Xamantina, Mato Grosso Foto: Endrigo Dalci/ Arquivo Pessoal
Tempo de entrega de equipamentos como tratores chega a 12 semanas, o maior já registrado pela Abimaq; desabastecimento se reflete nos preços dos produtos, que já registram aumento entre 40% e 50%.
O produtor de grãos Endrigo Dalcin, de Nova Xavantina (MT), planeja comprar sua quinta plantadeira para acelerar o cultivo da próxima safra de soja, no início de outubro. Mas não tem sido fácil colocar a ideia em prática. Desde março, ele negocia com três fabricantes, que deram prazo de até oito meses para a entrega da máquina – ou seja, ela só chegaria depois de iniciado o plantio. “Eu queria uma máquina com bastante tecnologia embarcada. Com ela, certamente eu plantaria dentro da janela ideal”, diz Dalcin. Com a dificuldade, o produtor já pensa em desistir da compra.
O caso de Dalcin não é isolado. O agronegócio vive um momento de forte expansão, com os preços de commodities agrícolas em alta no mercado internacional por causa, principalmente, do crescimento da demanda chinesa. Os produtores querem aproveitar esse momento para ampliar ou modernizar seu maquinário, o que melhoraria a produtividade. Mas os fabricantes, às voltas com dificuldades no fornecimento de peças e até de aço, têm esticado cada vez mais os prazos de entrega. Em resumo: há uma longa fila de espera por máquinas agrícolas.
O vice-presidente sênior da AGCO Corporation e chefe global da fabricante de máquinas agrícolas Massey Ferguson, Luis Felli, conta que está com sua linha de produção praticamente tomada até outubro. “Eu posso aumentar a minha capacidade, mas preciso de peças. Todos os fabricantes de máquinas agrícolas estão desafiados, com fila para entregar”, diz.
Já o diretor da New Holland Agriculture para o mercado brasileiro, Eduardo Kerbauy, diz que ainda tem tratores de algumas linhas, pulverizadores e plantadeiras para pronta-entrega. Mas, de modo geral, há atraso. “Há produtos que tinham disponibilidade imediata e, hoje, demoram dois meses; e os que levavam dois meses para serem entregues, agora levam quatro. Quanto mais personalizada a máquina, mais o concessionário vai pedir para esperar”, diz.
No mercado em geral, o prazo médio para a entrega de máquinas agrícolas está em 12 semanas (ou cerca de três meses), de acordo com a Câmara de Máquinas Agrícolas da Abimaq (CSMIA). É o maior período da série histórica desse indicador. “No ano passado, nesta mesma época, esse prazo era de sete semanas”, afirma Pedro Estevão Bastos, presidente da CSMIA. Ainda assim, as indústrias falam em vendas até 20% superiores neste ano em relação a 2020 (leia mais informações nesta página).
Preços em alta
As fabricantes de equipamentos, ao mesmo tempo em que veem a demanda aumentar, encaram uma menor oferta nacional de aço desde o ano passado, quando siderúrgicas desligaram temporariamente alguns fornos prevendo uma demanda menos aquecida nos meses seguintes da pandemia, o que não se confirmou no setor agropecuário. “Hoje, falta não apenas chapa de aço e tubo redondo, como também mola, eixo, amortecedor, engrenagem, roda, porca, tudo o que vai ferro”, diz Bastos, da Abimaq. “Isso desorganiza toda a cadeia de máquinas.”
O que se reflete também nos preços. Segundo Carlos Cogo, sócio-diretor da consultoria Cogo Inteligência em Agronegócio, os preços das máquinas tiveram alta entre 40% e 50%, dependendo do produto. Um dos fatores que têm levado os valores para cima é exatamente a alta do preço do aço, que desde o ano passado praticamente dobrou.
Segundo Cogo, a falta de peças é generalizada e há casos de clientes que tentaram importar pneus dos EUA, sem sucesso. “Mesmo quem tem os recursos para pagar a máquina à vista, não consegue. Não tem máquina. Isso vai afetar o desempenho do setor, e vai acabar redundando em prejuízo.” (O Estado de S.Paulo, 16/5/21)
Máquinas agrícolas usadas viram alternativa para produtores rurais
Legenda: Everton Mialich, que produz cana-de-açúca, recorreu a um leilão para comprar uma colheitadeira Foto: CELIO MESSIAS/ESTADÃO - 06/05/2021
Para driblar a falta de produtos nas revendas, agricultores recorrem até a empresas de leilão.
Sem expectativa de regularização na produção de equipamentos, os produtores rurais estão se adaptando. Everton Mialich, que produz cana-de-açúcar em Catanduva (SP), por exemplo, recorreu à compra de uma colheitadeira usada, depois de observar os preços da máquina subirem cerca de 50% em um ano e com os prazos de entrega chegando a seis meses – tempo que não poderia esperar. “A entrega está demorando muito; se eu esperasse, perdia a colheita”, explica.
Pela colheitadeira – que pode custar cerca de R$ 1 milhão se for nova –, ele desembolsou R$ 45 mil em uma plataforma de leilões. A procura no site cresceu no último ano puxada não só por agricultores, mas também empresários de diversos setores industriais, que tentam driblar a escassez de maquinário e longos prazos de entrega.
Para realizar os eventuais reparos necessários nas máquinas e veículos, o agricultor conta que tem uma oficina dentro de seu sítio, onde ele mesmo consegue fazer os consertos. Mialich, depois da primeira experiência, quer dar mais um passo. “Gostei do leilão. Agora, estou namorando um caminhão”, afirma. Ele chegou a participar de um leilão para tentar adquirir o veículo, mas achou que o preço não era vantajoso. “Saiu pelo valor de mercado, aí já não compensa. Dependendo da quantia que você tem para gastar com uma manutenção, se torna caro.”
Demanda em alta
Segundo Jacqueline Luz, diretora comercial da MaisAtivo, empresa de intermediação do Grupo Superbid, uma plataforma online de leilões, o mercado está muito propenso às máquinas usadas. Isso porque a indústria está desabastecida, o que leva a uma valorização dos produtos de segunda mão. Os produtores de menor porte, segundo ela, fazem os reparos necessários nos equipamentos comprados e os recolocam na ativa.
Segundo ela, a participação do agronegócio na plataforma vem crescendo. Por lá, 35% do total de lotes vendidos no marketplace do Grupo Superbid já são relacionados ao mercado agro. Equipamentos e máquinas representaram 22% do faturamento em 2020, ampliando participação sobre os 18% em 2019 (O Estado de S.Paulo, 16/5/21)