BRF:Principais executivos devem ser mantidos após eleição de novo conselho
O primeiro escalão de executivos da BRF deve ser mantido após a eleição do novo conselho de administração, dado o entendimento de grandes acionistas de que as mudanças mais necessárias na empresa são de estratégia, disseram três fontes com conhecimento direto do assunto à Reuters.
“Os executivos atuais não têm culpa pela situação atual da empresa”, disse a fonte, sob condição de anonimato. “Além disso, eles têm uma visão muito clara do que precisa ser feito.”
Mergulhada numa crise profunda, com alto endividamento e alvo de uma investigação por fraude sanitária, a BRF, maior exportadora de carne de frango do mundo viu suas ações na B3 perderem mais da metade do valor desde o início de 2017, precipitando uma forte disputa entre dois grupos de acionistas pelo futuro da empresa.
A sucessão de crises levou um dos grupos, formado pelos fundos de pensão Previ (dos empregados dos Banco do Brasil) e Petros (dos funcionários da Petrobras), além do fundo europeu Aberdeen a pleitear a mudança do conselho da BRF, assunto que será votado numa assembleia de acionistas no próximo dia 26.
Esses investidores, que em conjunto detêm cerca de 27 por cento do capital da BRF, querem reduzir o poder do grupo rival liderado pelo empresário Abilio Diniz, hoje presidente do conselho da empresa. Ele tem como aliado o fundo brasileiro Tarpon, e juntos detêm cerca de 12 por cento das ações da BRF.
Tentativas de formar uma chapa unificada fracassaram e o Aberdeen sugeriu a adoção do voto múltiplo, sistema que dá aos investidores poder de voto proporcional ao número de assentos no conselho.
Segundo a fonte, esse modelo não é o ideal para a BRF, uma vez que reduz as chances de composição de um conselho mais “harmônico”. Mas isso não deve impedir a adoção de mudanças estratégicas importantes”.
Essas mudanças, que serão sinalizadas ao mercado pouco depois da eleição do novo conselho, devem incluir um foco a tornar a BRF numa empresa mais ligada a alimentos e menos a proteínas, ao se concentrar em produtos com melhores margens.
“Há também trabalho a fazer em termos de reposicionamento geográfico e de táticas comerciais”, afirmou a fonte, sem no entanto detalhar se isso envolverá vendas de ativos.
Uma abertura de capital da subsidiária OneFoods, voltada para o mercado muçulmano, ficará para um segundo momento, acrescentou a fonte.
O conflito entre dois grupos no conselho têm há tempos sido uma preocupação de investidores, com o grupo comandado por Diniz influenciando na maior parte das decisões importantes da companhia.
De acordo com a fonte, uma das ênfases do novo conselho será justamente dar maior autonomia aos executivos, após terem recebido as novas orientações estratégicas do novo conselho.
Consultada sobre a reportagem, a BRF afirmou que não iria comentar sobre o assunto.
A Península, veículo de investimentos do empresário Abilio Diniz, não respondeu de imediato a pedidos de comentários.
José Drummond Jr. assumiu como presidente global da BRF em dezembro, no lugar de Pedro Faria. Dois meses antes, Lorival Luz Jr. havia assumido a diretoria financeira e a área de relações com investidores do grupo.
Uma segunda fonte afirmou que a nova diretoria ainda não fez “qualquer tipo de apresentação dos atuais executivos. Não dá para avaliar ainda se já começa a dar resultado a nova gestão”. Entretanto, na avaliação da fonte, “se eles estão lá, algum mérito têm. É preciso dar um voto de confiança”. O comentário foi ecoado por uma terceira fonte, que afirmou que “de fato, a gestão atual merece muito crédito por manter o foco, apesar de todo o barulho no nível do conselho”.
Faria chegou a ser preso em março na segunda etapa da operação Carne Fraca, da Polícia Federal, por suspeita de ter atuado para impedir denúncias de fraude em exames laboratoriais sobre a qualidade de produtos de frango para exportação. A Polícia Federal entendeu que a alta administração da BRF sabia de fraudes cometidas pela empresa entre 2012 e 2015.
A segunda etapa da Carne Fraca fez em meados de março o Ministério da Agricultura suspender temporariamente produção e certificação sanitária de produtos de aves da BRF exportados do Brasil para a União Europeia. A medida afetou 10 de 35 unidades produtivas da BRF no Brasil.
A segunda fonte comentou que entre as situações mais urgentes a serem lidadas pela BRF enquanto se prepara para escolha de um novo conselho é “lidar com o possível fechamento do mercado europeu para o frango”. Segundo a fonte, “a empresa tem que estar ativa. Tem que evitar a todo custo o banimento”.
O ministro da agricultura, Blairo Maggi, deve fazer na terça-feira uma apresentação à imprensa sobre as negociações do país com a União Europeia em torno das exportações de carne de frango. A apresentação acontecerá enquanto a Comissão Europeia avalia na terça e quarta-feiras se imporá restrições ao produto brasileiro (Reuters, 16/4/18)
Novo conselho da BRF continuará dividido
A disputa de poder na BRF, entre os fundos de pensão Petros e Previ e o empresário Abilio Diniz, deve terminar sem vencedores. Nem as fundações farão o conselho de administração que almejavam quando iniciaram o movimento para a reforma do colegiado, nem Abilio formará o grupo que pretendia para conduzir a empresa. É esse o resultado que deve sair de uma assembleia em que o conselho será formado por uma eleição com adoção do sistema de voto múltiplo.
Na quinta-feira à noite, a gestora de recursos Aberdeen, dona de 5% da BRF e aliada dos fundos de pensão, solicitou à companhia que o voto no conselho seja feito nominalmente, e não mais em chapa.
O pedido veio um dia após a empresa americana de assessoria de votos ISS – que tem forte influência sobre detentores de recibos de ações listados (ADRs) na Bolsa de Nova York – recomendar a chapa de conselheiros defendida por Abilio, e não a das fundações. Os estrangeiros donos de ADRs respondem por quase 9,5% do capital da BRF, segundo informações do site da companhia.
Fundos de pensão, Aberdeen e a gestora carioca Jardim Botânico, que lideram os esforços para reforma do conselho, detêm juntos quase 30% da BRF. Abilio mais os herdeiros da Sadia têm em torno de 10%. Caso a gestora Tarpon, dona de 7,3%, mantenha-se aliada ao empresário, o grupo chegaria a perto de 20%.
A Tarpon foi responsável pela indicação de Abilio à presidência do conselho da BRF em 2013, apoiada na época pela Previ. No ano passado, contudo, a união entre Abilio e Tarpon foi abalada.
No voto múltiplo, a contagem é feita sobre o capital presente à assembleia, e não sobre o total. Na média, os últimos cinco encontros anuais da BRF registraram participação de detentores de 78% do capital total. Em uma matemática simplificada, esse percentual indica que o grupo dos fundos de pensão tem condição de garantir, no mínimo, quatro participantes para o conselho e Abilio, a depender do apoio, de dois a três membros.
Ao todo, o novo colegiado, conforme colocado em votação na assembleia, deverá ter 10 membros. Tudo indica que o resultado final será ainda um conselho dividido.
Peter Taylor, diretor da Aberdeen no Brasil, disse que o pedido de voto múltiplo teve como objetivo preservar o apoio às fundações. Ele explicou que estrangeiros que escolhessem a chapa apresentada por Previ e Petros teriam os votos desconsiderados se, de última hora, fosse adotado o voto múltiplo (que poderia ser solicitado até 48 horas antes da assembleia). Para Taylor, a instalação do processo desde já permite que o estrangeiro compreenda melhor o cenário. Ele disse que a decisão de Abilio de indicar uma chapa concorrente – mas 70% idêntica à das fundações – confundiu os estrangeiros.
A preferência da ISS pelo grupo de Abilio ou as desconsiderações de voto na chapa poderiam prejudicar o resultado pretendido pelas fundações. No relatório, a assessoria também recomendou a abstenção dos investidores no caso de eleição por voto múltiplo.
Antes do pedido do voto múltiplo, a expectativa dos articuladores de Abilio era que os acionistas estrangeiros prefeririam o grupo proposto por ele, que tinha o ex-ministro Luiz Fernando Furlan na cabeça de chapa. A chapa sugerida pelo empresário poderia dar conta de dois problemas: terminaria com o protagonismo de Abilio, que incomodava o mercado, e elegeria um conselho com um presidente que conhece o negócio – Furlan é herdeiro da Sadia. Na chapa das fundações, o presidente é Augusto Cruz, atualmente à frente do conselho da BR Distribuidora.
Com o voto múltiplo, a definição do novo presidente é feita em assembleia pelos presentes e somente após a eleição, um a um, dos dez membros do colegiado, explicou a advogada Ana Carolina Passos, sócia da área societária do Cescon Barrieu.
A lista de candidatos a conselheiros da BRF, que contêm nomes trazidos pelas fundações e por Abilio e Furlan, não traz executivos com experiência na gestão da longa cadeia agropecuária e industrial da BRF. Mesmo os nomes sugeridos de última hora por Furlan – Luiza Trajano, dona do Magazine Luiza, e Vicente Falconi, reestruturador de empresas – não supririam essa deficiência. A ausência de conhecimento no setor era, aliás, a principal crítica dos herdeiros das Sadia aos nomes defendidos pelos fundos de pensão (Assessoria de Comunicação, 16/4/18)