Clube dividido – Editorial Folha de S.Paulo
G2-SUMMIT 2023
Cenário global dificulta desejo de Lula de usar G20 para elevar status do Brasil.
Criado em 1999 numa tentativa de dinamizar o diálogo multilateral após uma série de crises econômicas com repercussões globais, o G20 chega a este 2023 como um clube bastante dividido.
Reunindo as 19 principais economias do mundo mais a União Europeia, ao longo dos anos o grupo ganhou destaque como instrumento de diálogo que se prometia mais eficaz do que o combalido arcabouço desenhado pelas estruturas de Bretton Woods no pós-guerra, como o FMI e o Banco Mundial.
Mais importante, o G20 se lançava como uma agremiação de maior pluralidade, ante o exclusivismo do G7 das nações ricas.
O sucesso foi parcial, dada a falta de instrumentos de implementação de políticas e a queixa de países que ficaram de fora. Para piorar, quando começar sua reunião anual no sábado (9) na Índia, o G20 irá expor suas divisões cada vez mais acentuadas, uma decorrência de seu formato pouco rígido.
Para começar, a Guerra da Ucrânia impossibilita fotos conjuntas ou consensos amplos em suas atas.
Em termos simples, quando o assunto é a invasão russa, o mundo hoje se divide entre o Ocidente liderado pelos EUA, que apoia Kiev, e a China ao lado de Moscou —além de alguns países com peso suficiente para não se alinhar a um dos lados e buscar vantagens na crise, como os anfitriões e o Brasil.
Porém há mais nuvens no horizonte, decorrência do embate global entre Pequim e Washington, no qual por exemplo os indianos são rivais de Pequim. Com efeito, o líder chinês Xi Jinping não comparecerá ao evento para evitar elevar o status do premiê Narendra Modi, aplicando um duro golpe no G20.
No mês passado, eles estiveram na cúpula do Brics, onde a China engoliu pretensões de parceiros como o Brasil e saiu vitoriosa com uma expansão duvidosa do grupo.
Tudo isso dificulta os planos de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que receberá simbolicamente a presidência rotativa do G20 de Modi, para um mandato que começa de fato em dezembro e dura um ano. A coincidência seria ideal para o petista lustrar sua imagem externa após o ostracismo bolsonarista.
A visibilidade permitiria, no ideal governista, fazer avançar agendas como a ambiental e a de reforma de estruturas com poder um pouco mais real, como o Conselho de Segurança da ONU.
A opção de Lula por bater de frente com os países ricos no tema do clima parece travar o debate, no qual o Brasil tem voz. Quanto às Nações Unidas, o desejo, que já era quixotesco, ganha ares de quimera.
Caso haja melhora do cenário global, o Brasil ainda poderá fazer bom uso de seu ano em evidência. Todavia a realidade, até aqui, apresenta poucas oportunidades a Lula (Folha, 6/9/23)