11/02/2019

Desmistificando a distribuição de gás – Por Adriano Pires

Desmistificando a distribuição de gás – Por Adriano Pires

A sociedade precisa ter acesso a informações claras para que todos se libertem de crenças e mitos.

Com o início do novo governo, o setor de gás natural vislumbra o avanço das medidas legislativas e regulatórias necessárias para a abertura do mercado e sua consequente expansão. No entanto, este mercado e seu funcionamento ainda são um tema complexo à grande maioria. A distribuição de gás natural no País, por exemplo, é circundada por certos mitos, que precisam ser esclarecidos.

A distribuição e a comercialização são atividades distintas, e é essencial a diferenciação entre elas. A distribuição compreende a construção, manutenção e operação das redes de gasodutos destinadas a levar o gás aos pontos de consumo. O gás é obtido de produtores/importadores pelo distribuidor, que repassa esse custo do energético, não ganhando com a venda do gás, apenas com a atividade de distribuição da molécula. Já os comercializadores – e nada impede que a distribuidora seja um deles – utilizam as instalações de transportadores e distribuidores para o fornecimento de gás a seus clientes, pagando pela utilização dos gasodutos das distribuidoras e obtendo seus lucros na atividade de comercialização.

Como a distribuidora é uma das principais responsáveis pelo desenvolvimento da infraestrutura do mercado, levando gás ao consumidor final, cabe fazer mais uma desmistificação: a rede de distribuição nacional precisa, sim, de expansão. Menos de 5% dos domicílios são abastecidos por gás natural no País, enquanto na Argentina e na Colômbia, por exemplo, o porcentual supera os 65%. O Estado da Bahia, com 567 mil km² de extensão, tem 923,8 km de rede, enquanto a Itália, com 301 mil km², tem 260 mil km de gasodutos para distribuição. A malha de gasodutos de distribuição no Brasil tem apenas 34,4 mil km, com grande discrepância entre o Sudeste e as demais regiões. Como comparação, os EUA têm mais de 2 milhões de km de rede.

E como se dá o investimento em expansão e construção de gasodutos de distribuição? Por se tratar de um segmento regulado, cuja concessão é cedida pelos governos estaduais, o principal motor que viabiliza a expansão da rede é o próprio governo, por meio da aprovação e da fiscalização da realização do plano de negócios que garanta o equilíbrio econômico financeiro das distribuidoras. Vale destacar que o monopólio natural, característico deste segmento, garante num primeiro momento que o investimento inicial e o desenvolvimento ocorram na distribuição. Na conclusão desta etapa, deve-se viabilizar a privatização do ativo, junto com a gradual liberalização da cadeia, promovendo a verdadeira economia de mercado – competição aberta e direta.

A determinação das tarifas de gás natural ao consumidor final é outro mito, sustentado pela tese de que as distribuidoras são apenas atravessadoras e só servem para aumentar o preço ao consumidor. Ao contrário do que se acredita, a tarifa é composta pelo preço do gás (commodity + transporte), impostos/tributos e margem de distribuição, sendo apenas esta última parcela referente à distribuidora de gás. Ou seja, o preço da commodity e o do transporte não são definidos pela distribuidora, e sim pelo supridor e pelo transportador. As margens de distribuição são reguladas, calculadas pelas distribuidoras conforme o contrato de concessão, e aprovadas pelas agências reguladoras estaduais. Entretanto, não pode haver muita lentidão nos repasses do custo do gás para as tarifas pelo regulador. Caso contrário, reajustes abruptos – para baixo, como ocorreu em 2016 em São Paulo, ou para cima, como está acontecendo agora, também em São Paulo – causam muita confusão desnecessária e turbulência no mercado.

A sociedade brasileira precisa ter acesso a informações claras para que todos se libertem de crenças e mitos. Esse é um bom início para o fomento ao mercado de gás. Cabe ao governo pautá-lo em adequadas políticas de uso do energético em todos os setores e estabelecer bases regulatórias sólidas para atrair investimento, garantindo um mercado de gás natural mais dinâmico (Adriano Pires é diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura – CBIE; O Estado de S.Paulo, 9/2/19)