Família Civita vende Abril pelo preço simbólico de R$ 100 mil
Legenda: Logotipo da Editora Abril em prédio do grupo na marginal Tietê, em São Paulo
Empresário Fábio Carvalho, com apoio do BTG, vai negociar dívida de R$ 1,6 bi.
A família Civita fechou a venda do Grupo Abril para o empresário Fábio Carvalho, das redes de lojas Casa & Vídeo e Leader, sediadas no Rio, e deixou a imprensa depois de 68 anos.
O valor do negócio, simbólico, é de R$ 100 mil. O grupo tem uma dívida de R$ 1,6 bilhão, sendo dois terços com Itaú, Bradesco e Santander, e está em recuperação judicial desde 16 de agosto. A expectativa é que a compra esteja concluída em um mês e meio.
Carvalho, que é advogado, tem um histórico de assumir empresas em dificuldades para buscar eventual retomada. Para viabilizar a nova compra, ele tem o suporte da Enforce, do BTG Pactual, que conversa com os três bancos para adquirir com desconto a dívida de R$ 1,1 bilhão.
O BTG está em seus planos também para investimento e parceria. "É um banco com o qual a gente tem relação há muitos anos", diz. "É o único banco de porte que tem área específica dedicada a financiamentos para empresas em reestruturação. Área da qual a gente já tomou muito dinheiro emprestado e já pagou muito dinheiro de volta."
Por enquanto, o que antecipa é injetar, no fechamento da operação, esperado para fevereiro após a aprovação pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), R$ 70 milhões de recursos próprios.
Ele afirma que o Grupo Abril "vem evoluindo muito rapidamente no controle do desempenho financeiro", nestes quatro meses em recuperação judicial, e "com esse reforço vai atingir nova estabilidade". Não há previsão de cortar mais títulos de revistas.
"Queremos evitar que um processo de crise venha a afetar um dos grandes ativos do grupo, que é sua história, seus padrões de jornalismo", disse.
"A gente quer manter e partir para melhor, com a adoção de novas plataformas para oferecer esse conteúdo."
Um dos projetos teria como parceiro o próprio BTG. "Onde existe uma demanda grande, não só do BTG, é por mais fluxos de visitantes digitais focados em investimento. Esse é o princípio por trás de empresas como Infomoney. É uma oportunidade que a gente vai explorar, sim."
Para tanto, o grupo "tem a Exame, tem uma tradição de cobertura de negócios". Embora repita não ser o único, Carvalho diz que "o BTG é manifestamente interessado nesse tipo de audiência".
De maneira geral, o empresário diz que se trata de um conteúdo "de alta demanda, alta valorização", que será buscado também por todos os concorrentes, mas que, embora seja aquele "do momento, o que está em voga", há outros em evolução.
O objetivo maior, diz, é "encontrar novos paradigmas para a instituição imprensa". Trata-se de "desafio não só empresarial mas institucional, de encontrar a forma de fazer jornalismo com sustentabilidade e qualidade, devolvendo um pouco mais de racionalidade às conversas" no país.
"A gente acabou de passar por momentos de debates bem rasos, extremados", acrescenta. "Está muito claro que a conversa precisa voltar a ficar mais rica."
Após propor o negócio há quatro meses, Carvalho foi diagnosticado com câncer no intestino, ainda no princípio. O tratamento que se seguiu, ao mesmo tempo em que o negócio avançava, incluiu quimioterapia e foi bem-sucedido, afirma: "Recuperei rápido, novo em folha".
Antes de se lançar como empresário com a Casa & Vídeo, Carvalho atuara em diversos processos de recuperação de empresas realizados pela consultoria Alvarez & Marsal, onde trabalhava. A primeira foi a companhia aérea Varig, e a última, a própria Casa & Vídeo.
Ele deve assumir em fevereiro como presidente-executivo do Grupo Abril, no lugar de Marcos Haaland, sócio da mesma Alvarez & Marsal que foi chamado para iniciar a recuperação.
Em nota, Giancarlo Civita, que presidia o grupo, afirmou sobre Carvalho: "A família delega a ele a tarefa de administrar os desafios e as oportunidades que estão no horizonte da nova mídia. Fábio reúne as características de empreendedor e a visão de negócio que os novos tempos exigem".
Ainda sobre as dívidas e o processo de recuperação judicial, Carvalho afirmou que "o privilégio legal e moral é dos mais necessitados, as [dívidas] trabalhistas".
Paulo Zocchi, presidente do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo, afirmou que "a recuperação judicial prossegue, com seus ritmos e prazos, e o sindicato tem uma posição clara". "Todas as dívidas trabalhistas e dos freelancers têm de ser pagas o mais rápido possível e na íntegra." (Folha de S.Paulo, 21/12/18)