Impulsionando o futuro do agronegócio
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Por Amauri Brazil , Vinicius Baracat , Hitalo Ribeiro e Gian Di Gregorio
Investimentos governamentais parecem atingir pontos críticos do agro, mas é preciso atentar aos dogmas políticos do governo.
Há décadas o Brasil desfruta de uma posição de destaque no cenário global do agronegócio, sendo reconhecido como um dos mais relevantes provedores de alimentos do mundo. O modelo econômico de crescimento é função do acúmulo de capital, da população produtiva, do capital humano e dos ganhos em produtividade via inovação tecnológica. O Brasil, como qualquer outra economia em desenvolvimento, também colhe benefícios relevantes por meio do investimento de capital em infraestrutura.
Como o principal fornecedor de soja, carne bovina, café, milho, suco de laranja e açúcar do mundo, o País demonstra ser uma potência no setor agro, que já representa 24% do PIB nacional (Cepea). Apesar disso, o segmento ainda tem muitos desafios. Em 2024, prevê-se uma redução na safra de grãos por causa de fatores climáticos como o El Niño. Neste cenário, o governo federal anunciou, no início de fevereiro, dois grandes planos de investimento para o agronegócio, buscando manter o País competitivo e potencializar ao máximo as safras deste ano.
O anúncio do primeiro pacote veio pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com R$ 6 bilhões, sendo R$ 4 bilhões para financiamento dos produtores por meio de linhas de crédito dolarizadas e R$ 2 bilhões para o programa Procapcred. Já o segundo pacote, de R$ 4,7 bilhões, foi anunciado pelo governo federal e será destinado à infraestrutura.
Os R$ 4 bilhões em linhas de crédito são atrativos aos produtores rurais, já que oferecem proteção contra flutuações cambiais e diversificação de crédito, e são especialmente importantes para produtores exportadores que têm receitas atreladas ao dólar.
Entretanto, nas duas safras passadas, o produtor sofreu com a alta nos preços dos insumos agrícolas e com a queda no preço de venda das commodities, afetando as margens do setor. A linha de crédito dolarizada pode servir de motor ao setor, reduzindo custos e melhorando a competitividade, mas pode excluir micro e pequenos produtores, que têm maior dificuldade de acesso a crédito, afetando a inclusão financeira no agronegócio.
Por outro lado, o BNDES Procapcred foi melhorado, beneficiando cooperativas com financiamento direto aos associados. O limite aumentou para R$ 100 mil por cliente, com taxas menores e prazos mais longos, especialmente para cooperativas do Norte e do Nordeste, buscando equilibrar o acesso ao crédito.
Apesar do caráter complementar, esse investimento parece ter o intuito de desafogar o pequeno produtor de suas dívidas atuais, sem gerar reais impactos e inovações em áreas críticas nas quais a falta de investimento contribuiu para as margens apertadas e para o alto endividamento. Possivelmente, investimentos diretos na produção nacional de insumos agrícolas ou o acesso mais barato a eles pudessem impactar o pequeno produtor de forma mais objetiva. Apesar de fornecer um respiro a pequenos produtores, a solução apenas adia o problema e os mantém sujeitos às intempéries mercadológicas.
Adicionalmente, o governo federal apresentou um pacote de R$ 4,7 bilhões para infraestrutura, focando em ferrovias e rodovias nos corredores do Arco Norte e Sul/Sudeste, visando a melhorar o escoamento da safra 23/24. Os recursos também serão direcionados para portos e hidrovias, facilitando o acesso ao mercado externo. Esse plano aborda os problemas estruturais do agronegócio, impactando produtores de todos os tamanhos, desde agricultores familiares até grandes exportadores. A qualidade e a escassez de vias de escoamento prejudicam a eficiência e a escalabilidade do setor, tornando sua cadeia mais vulnerável.
Neste contexto, o governo federal prevê um investimento de R$ 349 bilhões para o setor logístico nos próximos anos, direcionando R$ 221 bilhões até 2026. Assim, o plano apresentado representa apenas 1,3% do total projetado para a logística nacional, parcela pouco representativa. Além disso, não fica claro em que momento serão feitos os próximos investimentos e quais serão os valores investidos.
Além da questão logística, a falta de infraestrutura de armazenamento primário de grãos também deveria ser foco de investimento, o que resultaria em maior proteção dos agricultores e aumento da competitividade. Melhores e mais sistemas logísticos e de armazenagem oferecem ao produtor espaços temporais de negociação de preços mais favoráveis e o colocam menos à mercê do preço spot da commodity.
Assim, cabe ao governo focar investimentos para o aumento da robustez das cadeias de produção de insumos agrícolas, em especial para fertilizantes; e facilitar o acesso às linhas de financiamento mais baratas a esses insumos, aliviando a margem dos produtores e gerando um impacto e retorno maiores dos recursos.
Os anúncios parecem atingir pontos críticos do agronegócio. Ao buscar equilibrar os impactados, pelo anúncio da linha de crédito dolarizada e do suporte às cooperativas, o governo demonstra entender que todos os níveis da cadeia do agro sofrem pressões monetárias no momento. E o pacote voltado para a infraestrutura demonstra uma visão de longo prazo.
Entretanto, é preciso atentar aos dogmas políticos do governo, que busca aproximar-se das cooperativas, porém sem um plano concreto para tornar a agricultura familiar mais resiliente e competitiva no cenário global. Apesar de o plano de infraestrutura endereçar áreas críticas da cadeia logística do agronegócio, é necessário um olhar cuidadoso sobre a velocidade e a qualidade das obras públicas para que estas resultem em impactos positivos para os agricultores do País. O onde é feito o investimento parece bem direcionado, falta apenas entender quais novos investimentos serão anunciados para a área logística e do agronegócio, para atingir os montantes previstos pelo governo, e quando os investimentos já anunciados serão implementados (Amauri Brazil , Vinicius Baracat , Hitalo Ribeiro e Gian Di Gregorio são, respectivamente, diretor, analistas e diretor sênio da Alvareza & Marsal; Estadão, 20/3/24)