29/01/2018

Movimento é guerra fiscal em escala global, diz Fazenda

Movimento é guerra fiscal em escala global, diz Fazenda

 Tendência no exterior é redução do Imposto de Renda a patamares inferiores a 20%, dizem especialistas do setor.

A redução do imposto corporativo em vários países é semelhante a uma guerra fiscal em escala global e poderá estimular empresas brasileiras a transferir seu domicílio fiscal para o exterior, o que provocaria erosão da base de tributação, com impacto negativo sobre as contas públicas, avaliou João Manoel Pinho de Mello, secretário de Produtividade do Ministério da Fazenda.

“Isso é preocupante”, afirmou, ressaltando que a Receita Federal teria mecanismos para “ir atrás” desses lucros. Ainda assim, o cenário criaria insegurança jurídica e aumento da litigiosidade, com impacto sobre a produtividade. Mello lembrou que, no ano passado, a JBS tentou transferir sua sede para a Irlanda, onde o IR é de 12,5%, mas o movimento foi barrado pelo BNDES, que tem 21% do capital da companhia. 

Dan Ioschpe, presidente do Fórum de Empresas Transnacionais Brasileiras, também acredita que o corte de tributos nos EUA e na Argentina vai estimular empresas a mudar para outros países, ainda que a atividade produtiva seja mantida no Brasil. “Se não ajustarmos a tributação com alguma velocidade, as empresas ou não se internacionalizarão, por não serem competitivas, ou terão de transferir seu domicílio para outros países, com o objetivo de se manterem competitivas.”

Além de enfrentarem alíquotas mais elevadas que a maioria de seus concorrentes, as empresas brasileiras com subsidiárias nos EUA não serão totalmente beneficiadas pelo corte do IR para 21% aprovado em dezembro. Isso porque o Brasil não adota o princípio da territorialidade na tributação do lucro de filiais no exterior e exige a diferença entre o que foi recolhido por elas e a alíquota de 34% vigente no País.

As companhias têm benefícios que reduzem o valor final a ser pago, entre eles crédito fiscal de 9% e possibilidade de parcelamento do tributo. Mas as vantagens não são dadas a investimentos em países que cobram menos de 20% de IR corporativo, disse Gustavo Carmona, da Ernst & Young. 

“A tendência de redução global de alíquotas e seu corte a patamares inferiores a 20% em alguns países restringirá cada vez mais esses benefícios a empresas que têm negócios no exterior, dificultando ainda mais sua internacionalização”, afirmou. O Reino Unido, por exemplo, cortou sua alíquota do IR das empresas de 20% para 19% no ano passado e haverá nova redução para 17% em 2020.

Mello, da Fazenda, ponderou que a alíquota efetiva no Brasil é inferior a 34%, em razão de deduções. Também ressaltou que os dividendos distribuídos aos acionistas são isentos. Ainda assim, disse que o movimento global de corte forçará o Brasil a encarar os problemas de seu sistema tributário.

Reforma tributária precisa avançar, dizem empresários

 

Queixas de que sistema tira competitividade do País ganham força com mudanças aprovadas nos EUA em dezembro.

Diretora executiva da seção americana do Conselho Empresarial Brasil-Estados Unidos, Cassia Carvalho disse que os cem associados da entidade têm manifestado preocupação com a perda de competitividade do Brasil e sinalizado a intenção de priorizar investimentos no território americano, especialmente depois do corte do Imposto de Renda corporativo de 35% para 21%, aprovado em dezembro. “É por isso que a reforma e a simplificação tributária no Brasil são importantíssimas”, afirmou. “Essa agenda tem de avançar. Do contrário, ficaremos cada vez mais para trás.” O conselho reúne as multinacionais americanas que têm investimentos no Brasil. 

Cassia disse ter esperança de que o Congresso aprove pelo menos medidas pontuais de simplificação antes de março, entre as quais a relativa ao PIS/Cofins.   

Curto prazo. João Manoel Pinho de Mello, secretário de Produtividade do Ministério da Fazenda, ponderou que a frágil situação fiscal do Brasil inviabiliza uma discussão sobre corte de impostos no curto prazo. “Com o País entrando em uma rota de crescimento e conseguindo aprovar a reforma previdenciária, será natural pensar em uma reforma tributária”, observou.

“A questão é a competitividade”, disse Dan Ioschpe, presidente do Fórum de Empresas Transnacionais Brasileiras. “A tributação é tratada como um fator de custo ao redor do mundo.” Segundo ele, a subsidiária de uma empresa brasileira nos EUA terá dificuldade em concorrer com outras instaladas no país porque terá de pagar parte da diferença entre a nova alíquota de 21% e os 34% exigidos no Brasil. “Ou ela acha outra maneira de reduzir o custo, o que é difícil, ou vai perder mercado.”

Os EUA também tributavam o lucro obtido no exterior por suas empresas, mas só no momento em que ele era internalizado. Isso levou companhias americanas a acumularem estimados US$ 2,6 trilhões em lucro fora das fronteiras do país. A reforma de dezembro mudou a forma de tributação e criou incentivos para as empresas repatriarem os recursos. Em vez de 35% de IR, elas pagarão 15,5%. 

No dia 17, a Apple anunciou que levará para os EUA os recursos que mantém no exterior, pelos quais pagará impostos de US$ 38 bilhões. Isso corresponde a um total de US$ 252,3 bilhões, o maior volume mantido por uma companhia americana fora do país  (O Estado de S.Paulo, 28/1/18)