06/01/2025

O ano do carro elétrico chinês no Brasil

O ano do carro elétrico chinês no Brasil

Picape híbrida BYD Shark – Foto Divulgação

 

Empresas apostam para 2025 em crescimento de demanda e infraestrutura adequada a esse tipo de veículo no país.

 

Acompanhando de longe é difícil materializar a tal revolução no setor automobilístico brasileiro trazida pelas montadoras chinesas.

 

Morando como estou há quase três anos em Washington, a noção de sucesso de marcas como a BYD e GWM quase sempre se dá por meio dos anúncios que vejo nas redes sociais ou em um ou outro modelo que vi circulando por capitais daqui.

 

Qual não foi minha surpresa, então, ao ver não um ou dois, mas dezenas de BYDs Dolphin e GWMs Haval H6 circulando pela pacata Diamantina, minha cidade natal em Minas Gerais?

 

Com seus 40 e poucos mil habitantes, calçamento de pedra e uma extensão territorial tão diminuta que os dois únicos semáforos da cidade por muitos anos eram ponto de referência, Diamantina mal tem infraestrutura para carros automáticos. Mas neste Natal, em todas as esquinas era possível ver um carro elétrico chinês.

 

É um sinal inequívoco de que, aos poucos, a tecnologia chinesa de eletrificação deixa de ser um bicho de sete cabeças ou produto de ficção científica e começa a se interiorizar. Ainda faltam insumos essenciais para vê-la deslanchar nos níveis da China —onde é possível não apenas carregar rapidamente os veículos em qualquer posto como também substituir baterias inteiras em questão de

minutos—, mas este é um bonde que já zarpou.

 

China, terra do meio

 

Curioso que este fenômeno aconteça em um arcabouço tributário atrasado, com o retorno gradual de impostos a carros híbridos e elétricos neste ano (com taxas que devem ficar de 18% a 25%). É uma política protecionista que talvez faça algum sentido na Europa, onde montadoras tradicionais como a Volkswagen, Peugeot e Fiat caminham a passos de tartaruga na eletrificação e perdem competitividade, mas que em um Brasil sem concorrência direta e metas climáticas ambiciosas, só tem função arrecadatória.

 

Mesmo assim, por falta de concorrência, mas também pelo custo-benefício que oferecem, as montadoras chinesas continuam competitivas e apostam forte por aqui. A GWM, com fábrica em Iracemápolis (interior de SP) planeja começar a fabricação local das suas caminhonetes eletrificadas ainda este ano.

 

Esse também é o plano da BYD em Camaçari (BA), que a despeito do escândalo dos trabalhadores resgatados em condição análoga à escravidão em suas dependências no mês passado, fala em contratar cerca de 10 mil pessoas até agosto, mirando a capacidade de produzir 150 mil automóveis por ano na antiga planta da Ford.

 

Essas empresas apostam em um crescimento de demanda e infraestrutura adequada para esse tipo de veículo no Brasil. Por muito tempo, deixamos de apostar na eletrificação da frota para priorizar biocombustíveis produzidos nacionalmente, caso do etanol.

 

Tínhamos um modelo sustentável e menos agressivo que os dos carros elétricos (cujas baterias ainda demandam minerais raros cuja mineração continua predatória), mas que o mundo não quis adotar.

 

É bastante possível, então, que 2025 seja o ano do carro elétrico chinês no Brasil, enquanto rezam as montadoras europeias pela viabilização do acordo UE-Mercosul que poderia dar uma sobrevida aos seus veículos até que sejam capazes de alcançar as concorrentes asiáticas. Esse cenário, por ora, continua distante (Folha, 4/1/25)