O potencial de produção de trigo no país é bom, mas há desafios
TRIGO Foto Dida Sampaio Estadão
Entre as dificuldades estão combate a doenças, desenvolvimento de novas variedades e estruturação da cadeia em novas regiões.
O país está despertando para o trigo, e as perspectivas de crescimento são consistentes. O Brasil precisa, no entanto, resolver problemas específicos de cada região.
Para Roberto Rodrigues, coordenador do FGVAgro e ex-ministro da Agricultura, o cerrado, a partir de agora, e em definitivo, está no caminho do trigo. A tropicalização do cereal é garantia de crescimento.
A área de plantio está disponível no cerrado, mas a Embrapa precisa ainda fazer alguns acertos contra doenças que afetam a cultura e adaptação de variedades, embora já tenha cultivar que renda próximo de dez toneladas por hectare na região.
Jorge Lemainski, chefe-geral da Embrapa Trigo, diz que um dos desafios é o controle da brusone, uma doença que se manifesta com manchas nas folhas e branqueamento e morte das espigas na áreas quentes.
O cerrado exige, ainda, variedades com poder de tolerância ao estresse hídrico. O tema foi discutido no 29º Congresso do Trigo da Abitrigo (Associação Brasileira da Indústria do Trigo).
A tropicalização do trigo no Brasil exige, ainda, um avanço da cadeia desse cereal para as novas regiões, que inclui desde o Centro-Oeste ao Norte e Nordeste.
No Sul, o ataque é da giberela, um fungo que deixa a planta doente, podendo comprometer tanto o volume como a qualidade do cereal. O aparecimento dessa doença depende muito das condições climáticas.
A Embrapa está desenvolvendo também novas variedades para o plantio de trigo destinado ao consumo animal. O plantio se dá no período de inverno no Sul, quando parte das terras do Paraná, de Santa Catarina e do Rio Grande Sul ficam inativas.
A pesquisa pode dar ao produtor uma cultura competitiva e que consiga, inclusive, disputar espaço com outros cultivos, como o milho.
Carlos Hugo Godinho, do Deral (Departamento de Economia Rural) do Paraná, estado que reduziu a área de trigo para 1,18 milhão de hectares neste ano, credita essa perda à opção do produtor pelo milho, em geral mais rentável.
A produtividade do trigo no Paraná pode ultrapassar 3 toneladas por hectare em várias regiões. O preço deste cereal, para trazer rendimento melhor do que o do milho, no entanto, tem de superar em 1,8 vez o valor do milho. Daí a opção maior do produtor pelo milho, e não pelo trigo no estado.
Nos patamares atuais de preços desses dois cereais, o trigo, mesmo sendo negociado a R$ 92 por saca, ainda tem rendimento inferior ao do milho, que vale R$ 84.
No Rio Grande do Sul, a conjugação de uma série de fatores está melhorando a atividade no estado, segundo Hamilton Jardim, coordenador da Comissão de Trigo e Culturas de Inverno da Farsul.
O trigo gaúcho, com a melhora na qualidade, passou a ter maior aceitação no exterior, segundo Jardim. Os dados deste ano apontam um volume recorde das exportações. A qualidade é importante também para atrair mais os moinhos nacionais, afirma.
Convênios entre a indústria de produção de proteínas, como a ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal), e entidades representantes de produtores vão incentivar a produção de trigo, triticale, aveia e outros cereais de inverno.
Jardim diz que a aposta no aumento da produção de trigo no estado vem também da demanda da indústria de etanol, que se inicia e utiliza cereais de inverno.
O Rio Grande do Sul, ao contrário do Paraná, elevou a área de trigo neste ano. Foi semeado 1,45 milhão de hectares, 12% a mais do que em 2021. A produção deverá saltar para o recorde de 4,9 milhões de toneladas, o que permitirá ao país atingir um volume nacional próximo de 9,6 milhões de toneladas.
Apesar da alta dos custos, o produtor gaúcho ainda terá reembolso financeiro, segundo o representante da Câmara de Trigo. Para Godinho, do Deral, o desafio será a pressão de custos para a próxima safra.
O potencial de produção de São Paulo também cresce. O estado, que produzia apenas 90 mil toneladas há duas décadas, deverá atingir de 400 mil a 450 mil toneladas, segundo Ruy Zanardi, presidente da Câmara Setorial do Trigo de São Paulo.
Embora a busca no estado seja por um produto de qualidade e dentro das exigências dos moinhos, o estado tem capacidade para elevar essa produção para um patamar próximo de 800 mil toneladas nos próximos anos, afirma Zanardi.
Mesmo com produção bem inferior à do Paraná e do Rio Grande do Sul, São Paulo tem a cidade com o maior valor de produção de trigo do país. Essa liderança, segundo o IBGE, pertence a Itapeva, que registrou R$ 206 milhões em 2021 (Folha de S.Paulo, 29/9/22)