Por Ana Malvestio e Carlos Duque
As alterações introduzidas pela Reforma Trabalhista, que entrou em vigor em novembro passado, criaram novos arranjos nas relações de emprego e de trabalho e muitas delas ainda são questionadas acerca de seu real sentido e forma de aplicação no mundo jurídico. No agronegócio, muitas dúvidas e preocupações preenchem as agendas dos profissionais de Recursos Humanos de empresas dos mais diversos segmentos deste setor.
Alguns pontos despertam maior atenção devido ao potencial impacto direto nos custos com mão de obra, aspecto muito relevante para o setor. Nesse sentido, vale destacar três grandes mudanças: as chamadas horas in itinere, a terceirização de empregados para a atividade fim e a criação da modalidade de contratos intermitentes.
A mudança foi radical no direito às horas in itinere, cujo entendimento consolidado pela Súmula nº90 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) se refere ao tempo de deslocamento do empregado para o local de trabalho, no caso deste ser de difícil acesso ou não servido por transporte público, às custas do empregador. Com a Reforma, o empregador não é mais obrigado a considerar o tempo de deslocamento como parte da jornada de trabalho.
Como os locais de trabalho no agronegócio usualmente são afastados dos centros urbanos, o pagamento de horas in itinere pelas empresas é prática comum e, na maioria das vezes, registradas como horas extraordinárias, ou seja, mais onerosas. Os Acordos Coletivos em vigor preveem que a remoção unilateral dessa verba por parte da empresa pode dar margem a questionamentos. A avaliação do cumprimento do acordo vigente e remoção da previsibilidade do pagamento de horas in itinere nos acordos futuros pode ser uma alternativa, sem desconsiderar a dificuldade a ser enfrentada na negociação com os sindicatos e os trabalhadores. Por razões como esta, a extinção da obrigatoriedade vem causando discordância entre os especialistas, especialmente, no que tange à forma de implementação.
Já a possibilidade de terceirização da atividade fim, introduzida pela Reforma, trouxe ao mundo jurídico um antigo pleito do meio empresarial, ou seja, tornou possível contratar terceiros para prover mão de obra na realização do objeto social, em desacordo com as determinações da Súmula nº 331 do TST que antes vigia.
O principal aspecto para o agronegócio gira em torno da mitigação dos riscos na terceirização dos serviços de CCT (Corte, Carregamento e Transporte), via de regra, considerados atividade-fim da empresa, sendo interpretados como terceirização ilícita por diversas cortes trabalhistas do país. Com a nova lei, a terceirização desses serviços passa a ser uma opção vantajosa frente aos altos custos necessários para a sua realização.
É importante lembrar que remanesce vigente a responsabilidade subsidiária da empresa contratante caso a contratada não cumpra com suas obrigações legais de empregador. Isso significa que ao terceirizar qualquer atividade, tanto meio quanto fim, é necessário avaliar a capacidade da prestadora de serviços em cumprir com suas obrigações em relação aos empregados prestadores de serviço, pois caso ela não possa arcar com seus débitos, após ser acionada judicialmente, a responsabilidade recairá sobre o tomador do serviço.
Outro cuidado é garantir o cumprimento de todas as exigências legais previstas na Lei nº 13.429/17, especialmente os prazos, como o limite máximo de duração do contrato de trabalho temporário e a limitação temporal para recontratação dos mesmos empregados, entre outras.
A introdução de uma nova modalidade de contrato de emprego no ordenamento jurídico, chamado intermitente é outro destaque da Reforma Trabalhista. Nesse tipo de contato, a prestação de serviços ocorre de forma não contínua, alterando períodos de prestação e inatividade. Basicamente, a Reforma trabalhista tornou possível às empresas a contratação de funcionários por uma quantidade específica de dias no mês, ou até mesmo de horas.
Face à sazonalidade das safras, não é raro ocorrer oscilações significativas nos custos da produção agrícola devido à elevação dos gastos com mão de obra, pois, antes da Reforma, em muitos casos as empresas mantinham em seu quadro uma quantidade de colaboradores superior ao necessário nos períodos de entressafra, já que a demissão seguida de recontratação no período da safra poderia caracterizar a unicidade contratual, considerando assim o período em que o trabalhador não estava prestando serviço como parte de seu contrato de trabalho.
Assim, a instituição do contrato intermitente permite relevante oportunidade de redução de custos com a adoção dessa modalidade de contrato nas lavouras.
É importante ressaltar que essas mudanças envolvem variáveis diversas e complexas que devem ser mensuradas para que as oportunidades, riscos e benefícios sejam adequadamente avaliados. Mesmo assim, é certo que o agronegócio colherá ótimos frutos com essas novas possibilidades.
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