Pela 1ª vez, Brasil mais compra do que vende etanol
País fecha balança comercial de 2017 com déficit de 445 milhões de litros.
O Brasil fechou 2017 com um déficit na balança comercial de etanol, com importações superando as exportações do combustível pela primeira vez desde o início da série histórica divulgada pela ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis), em 2004.
A dependência externa é resultado da maior competitividade do etanol americano, que substituiu vendas do produto brasileiro na região Nordeste. Reflete também a suspensão de investimentos provocada pela crise do setor sucroalcooleiro.
Em 2017, o Brasil importou 445 milhões de litros de etanol a mais do que exportou --no ano anterior, houve superávit de 957 milhões de litros. O etanol importado foi responsável por 1,7% do abastecimento nacional.
O etanol importado estava mais barato do que a cabotagem para levar a produção do Centro-Sul, explicou o diretor técnico da Unica (União da Indústria Canavieira), Antônio de Pádua Rodrigues.
Ele prevê que o déficit seja zerado no fim da colheita da safra 2017-2018. "Se não tiver investimento para aumento da oferta, vamos ficar nessa gangorra", disse.
A crise do setor se iniciou em meados da década, com o represamento do preço da gasolina e a consequente perda de competitividade do etanol.
Para a Unica, a nova política de preços da Petrobras garante maior previsibilidade ao setor, ao refletir o cenário internacional.
O déficit ocorreu em um ano de queda no consumo de etanol hidratado, que perdeu espaço para a gasolina. Enquanto as vendas do derivado da cana caíram 6,47%, as de gasolina tiveram alta de 2,63%.
PETROBRAS
Pelo segundo ano consecutivo, empresas privadas tiraram da Petrobras fatia dos mercados de gasolina e de diesel no país, de acordo com dados da ANP, que trouxeram alta de 0,44% no consumo de combustíveis em 2017.
O déficit no comércio exterior de gasolina cresceu 82,23%, chegando a 4 bilhões de litros --a estatal foi responsável por apenas 21,4% das importações, contra 59,7% no ano anterior. Em 2017, 12,5% do mercado nacional de gasolina foi abastecido por produtos importados.
A concorrência é ainda maior no mercado de diesel. Em 2017, 24,7% do mercado foi abastecido importações. A Petrobras foi responsável por apenas 4,3% das compras externas, contra 16,4% no ano anterior (Folha de S.Paulo, 3/3/18)
Motorista ignora relação de preços e prefere etanol
O motorista para no posto, faz a conta para comparar qual combustível é mais vantajoso entre gasolina e o etanol - considerando o rendimento no tanque - e opta pela gasolina, certo? Não nos últimos meses. Desde dezembro, os preços do etanol estão acima de 70% do valor da gasolina nos principais centros consumidores, o que, em tese, torna o combustível fóssil mais vantajoso que o etanol. Mesmo assim o consumo de etanol segue crescendo a todo vapor. E a tendência é que as vendas do biocombustível sejam ainda maiores neste ano.
As explicações para esse quadro são várias. Para a maior parte dos analistas desse mercado, os motoristas estão assustados com os valores recorde da gasolina e passaram a ignorar a paridade de 70%, que seria equivalente ao rendimento médio, na frota da brasileira, do etanol ante a gasolina nos motores.
Na semana passada, a gasolina chegou a ser vendida por R$ 4,703 o litro nos postos do Rio de Janeiro, maior valor da história do Estado e um dos maiores preços do país. Em São Paulo, o recorde foi batido no início do mês, em R$ 4,019 o litro.
"Quando você percebe que o filé mignon está muito caro, você vai para a carne mais barata. É a mesma coisa nesse caso", avalia Martinho Ono, diretor da SCA Trading.
Presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis), Paulo Miranda Soares concorda. "Apesar de não estar na paridade, o etanol está R$ 1 mais barato que a gasolina. É uma migração para um produto mais barato, o consumidor brasileiro está com dificuldades", afirma. Para ele, o motorista pode até estar andando alguns quilômetros a menos do que estaria se estivesse abastecendo com gasolina, mas a diferença é pouca. "A correlação está muito próxima da paridade", diz.
Em São Paulo, que concentra quase 60% das vendas nacionais de etanol, o preço do biocombustível já está acima de 70% do valor da gasolina desde a primeira semana do ano e chegou a 72% em fevereiro, mas a diferença nominal tem se mantido acima de R$ 1,12 o litro. O mesmo ocorre em Minas Gerais. Responsáveis por mais de 10% das vendas de etanol do país, os postos mineiros registram uma diferença superior a R$ 1,20 o litro, apesar da correlação estar em 72% desde o fim de janeiro. Atualmente, o preço do etanol só está abaixo de 70% do valor da gasolina em Goiás e Mato Grosso.
Para Willian Hernandes, sócio da consultoria FG/A, a correlação de preços explica o comportamento da demanda, mas o patamar próximo de 72% ainda não faz o consumidor preterir o etanol. "A troca ocorre mais quando a relação chega a 74%".
O analista lembra que, na safra passada (2016/17), a variação dos preços do etanol foi mais ampla comparando o período de moagem e a entressafra. Naquele período, a correlação entre o etanol e a gasolina em São Paulo saiu de um patamar favorável ao etanol de 69% para 74% em poucas semanas.
Pelas contas da FG/A, as vendas de hidratado das distribuidoras aos postos em janeiro ficaram perto de 1,2 bilhão de litros - próximo ao nível de janeiro de 2016. Em relação a janeiro de 2017, quando o consumo foi bem fraco, isso representaria um acréscimo de quase 40%. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) divulga hoje o dado de janeiro.
Parte das usinas começa a retomar a moagem de cana já neste mês e com uma tendência bem mais alcooleira, o que deve elevar a oferta interna de etanol em breve. O analista da FG/A estima que a produção deve crescer na mesma proporção que a demanda, mas duvida que as vendas alcancem o recorde histórico registrado em 2015, quando foram comercializados 17,8 bilhões de litros de etanol hidratado no país. "A produção de açúcar teria que cair 6,5 milhões de toneladas (18%). Projetamos sim uma queda, mas não dessa magnitude", afirma (Assessoria de Comunicação, 2/3/18)