Por compliance, JBS treina diretores e audita fornecedor
A era das aquisições fechadas em prazo recorde e até sem auditoria prévia ficou para trás na JBS. Maior companhia privada não financeira do país, com vendas líquidas superiores a R$ 150 bilhões anuais, a empresa controlada pelos irmãos Joesley e Wesley Batista quer ser reconhecida entre as que têm as melhoras práticas de compliance.
Há um ano, o advogado e professor do departamento de direito comercial da Universidade de São Paulo (USP), José Marcelo Proença, assumia uma das tarefas mais espinhosas no mundo corporativo. Quando ele assumiu o cargo de diretor global de compliance da JBS, em 16 de junho do ano passado, as revelações dos Batista – que colocaram personagens da política em apuros – sequer haviam completado um mês. À época, havia até quem duvidasse da sobrevivência da gigante das carnes.
Um ano depois, Proença comemora os frutos do programa de compliance implementado na JBS. Intitulada de “Faça a Coisa Certa”, a política liderada pelo advogado recebeu o reconhecimento de instituições respeitadas como a Transparência Internacional e o Instituto Ethos.
Em abril, a JBS conseguiu o reconhecimento do Ethos para se tornar signatária do pacto empresarial pela integridade e contra a corrupção. “Também conseguimos o reconhecimento externo de uma ONG alemã”, disse Proença, em alusão à nota obtida pela companhia (8,1) no ranking da Transparência Internacional. No Brasil, a nota média foi 5,7. A JBS ficou na nona posição do ranking de transparência corporativa.
Em entrevista ao Valor, o advogado detalhou como obteve esses frutos. Boa parte disso está relacionada ao rigor no processos de due diligence de fornecedores de produtos e serviços.
Em parceria com a firma de auditoria Deloitte, a JBS desenvolveu um software que contempla mais de 20 bases de dados (processos judiciais nos Tribunais de Justiça, listas de trabalho análogo à escravidão, envolvimento com corrupção e lavagem de dinheiro, entre outras) para avaliar e obter alerta sobre fornecedores.
“Esse trabalho foi hercúleo, mas já está em fase final e 80% está implantado”, disse. Para dar efetividade às diligências, a JBS concentrou as auditorias em oito áreas consideradas de maior risco: escritórios de advocacia, empresas de resíduos, doações, despachantes e intermediários, firmas de consultoria e auditoria, entidades públicas, transportadoras e fornecedores de marketing, publicidade e comunicação.
Os setores foram escolhidos tendo em vista a sensibilidade e também a “herança” da JBS, afirmou. “Se você verifica a nossa herança de irregularidades envolvendo corrupção política, as empresas de publicidade têm um certo envolvimento com alguma constância”.
Segundo Proença, a auditoria completa das áreas críticas já apresentou resultados. “Consigo demonstrar que temos parceiros de negócios mais baratos”, disse, sem fornecer a redução percentual do valor dos contratos nas áreas.
Em outra frente, a equipe de compliance treinou diretamente mais de 1 mil funcionários da JBS sobre as regras de conformidade. Os 124 diretores da JBS, no Brasil e no mundo, tiveram atenção especial, sendo avaliados com rigor universitário de leituras obrigatórias e até com lição de casa.
Os diretores da JBS participaram dos treinamentos em grupos de 20 a 30 pessoas. “Saíram [do treinamento] com um calhamaço de coisas que devem ser lidas porque em algum momento serão cobradas. Minha experiência de magistério tem servido muito para isso”, disse o professor da USP.
Ele revelou otimismo com os investigações que estão sendo feitas na JBS por escritórios independentes para apurar as denúncia feitas pelos Batista e executivos na delação premiada. A tendência, afirmou, é que as investigações sejam concluídas até o fim deste ano. Esse passo é fundamental para a JBS retomar os planos de fazer a abertura de capital (IPO) da subsidiária JBS Foods Internacional na bolsa de Nova York (Nyse).
O diretor de compliance fez questão de ressaltar que se reporta “exclusivamente” ao conselho de administração da JBS. Indagado, Proença não quis fazer comentários sobre a estrutura da área de compliance que existia antes da delação. Naquela estrutura, o diretor de compliance se reportava ao então diretor jurídico da empresa, Francisco de Assis e Silva, que viria a ser um dos delatores da J&F, a holding dos irmãos Batista (Assessoria de Comunicação, 25/6/18)