24/05/2023

Por que o agro não gosta de Lula? Ruralistas citam seis motivos

Por que o agro não gosta de Lula? Ruralistas citam seis motivos

Lula - apoio do MST -  (reprodução-Reprodução) - REVISTA VEJA

Lula perguntou ao ministro da Agricultura por que integrantes do agronegócio ‘não gostam’ dele; Ruralistas listam pelo menos seis motivos para responder ao presidente

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva perguntou ao ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, por que o agronegócio não gosta dele. O relato foi feito pelo próprio ministro na segunda-feira, 22, durante uma entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura.

Ministro da Agricultura, Carlos Favaro tenta conciliar dialogo entre Lula e o agronegocio. "Ele me pergunta por que nao gostam dele", disse o ministro.  Foto- Reproducao-YouTube-Roda Viva

CARLOS FAVARO- Foto- Reproducao-YouTube-Roda Viva

Líderes do agronegócio e ruralistas do Congresso acumulam uma série de irritações com Lula desde que o petista assumiu a Presidência. Invasões promovidas pelo Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ligado ao PT, e comentários do petista estão entre os principais motivos.

Integrantes do governo fizeram movimentos para tentar uma conciliação de Lula com o agronegócio nos últimos dias, mas a situação não foi resolvida. Nesta terça-feira, 23, a Câmara iniciou os trabalhados da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do MST, instalada para investigar as invasões promovidas pelo movimento.

O funcionamento da CPI é uma derrota para o governo, que precisará lidar com a comissão enquanto tenta montar uma base de apoio no Congresso e aprovar projetos de interesse de Lula, como o arcabouço fiscal e o novo Bolsa Família.

Confira seis motivos que respondem a pergunta do presidente feita para o ministro:

Apoio a Bolsonaro

Líderes do agronegócio tiveram um alinhamento com o governo de Jair Bolsonaro e apoiaram a reeleição do ex-presidente. A avaliação no setor é que o petista não “engoliu” até hoje essa aliança do agro com seu opositor e vai tentar usar o governo para dar o troco. Bolsonaro venceu no primeiro turno em 77 dos 100 municípios com agro mais rico.

“Nós não temos problemas com esse agro, mas também queremos priorizar e apoiar a agricultura familiar”, responde o deputado Nilto Tatto (PT-SP), escalado para defender o governo na CPI do MST.

“O governo dá sinais absolutamente contraditórios e tem vivido uma certa esquizofrenia com o agro. Dá uma no cravo e outra na ferradura, mas vai ter que se definir”, disse o deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), vice-presidente da frente da agropecuária na Câmara.

A bancada ruralista tem 347 integrantes no Congresso.

Mudanças no Ministério da Agricultura

A bancada ruralista reagiu às mudanças promovidas por Lula no Ministério da Agricultura assim que o petista tomou posse como presidente, em janeiro. A pasta, que é comandada pelo ministro Carlos Fávaro, integrante da bancada ruralista, perdeu o Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (CAR), que centraliza as ações de regularização fundiária, para o Ministério do Meio Ambiente, comandado pela ambientalista Marina Silva (Rede).

Outros dois órgãos de interesse do setor - Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) - foram para o Ministério do Desenvolvimento Agrário, chefiado pelo ministro Paulo Teixeira, deputado licenciado do PT de São Paulo.

Invasões do MST

Invasões promovidas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), ligado ao PT, também afastaram o presidente do agronegócio. Ruralistas condenam as invasões e cobram do governo uma ação mais enérgica para conter atos ilegais.

As invasões levaram a Câmara a instalar uma CPI. O relator é o deputado Ricardo Salles (PL-SP), ministro do Meio Ambiente do governo Bolsonaro e opositor ferrenho do PT.

Foto oficial de encontro do presidente Lula com Xi Jinping na China com João Pedro Stédile do MST ao fundo Foto- Divulgacao - Dep. Fausto Pinato

 Lula - Xi Jinping na China e Joao Pedro Stedile -Foto- Divulgacao - Dep. Fausto Pinato

MST na China

O presidente Lula levou o principal líder do MST, João Pedro Stédile, para um encontro com o presidente da China, Xi Jinping, em abril. A presença de Stédile na comitiva ocorreu após a divulgação de vídeo em que o dirigente do movimento prometeu retomar as invasões de terra.

“O Bolsonaro deu um olhar melhor para o agro, eu não acho correto o PT vir e chutar. O menino está bonito e vamos bater nele para que ele fique fraquinho e machucado?”, disse o deputado Marco Brasil (PP-PR), integrante da bancada ruralista no Congresso. “O Lula não fez nada que prejudicou o agro, mas tem que suavizar esse discurso.”

‘Fascistas’

No dia 11 de maio, o presidente Lula fez menção à Agrishow, maior feita do agro no País, e disse que “alguns fascistas de São Paulo” não quiseram a presença do ministro da Agricultura no evento. O comentário irritou representantes do setor.

O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Pedro Lupion (PP-PR) afirmou ao Estadão que Lula estava se “distanciando” cada vez mais do setor, gerador de empregos e ganhos econômicos para o Brasil no exterior.

Feira do MST

A presença do vice-presidente Geraldo Alckmin e de outros ministros do governo na feira nacional do MST, no último dia 13, no momento em que o grupo promove invasões de terras incomodou integrantes da bancada ruralista no Congresso. Parlamentares chegaram a falar que o governo “arrancou” a ponte com o agro ao prestigiar o evento.

“É a fotografia que nós precisávamos para poder provar o envolvimento do governo com o MST nessas invasões de terra”, disse o segundo vice-presidente da Frente Parlamentar do Agronegócio na Câmara, deputado Evair de Melo (PP-ES). Somente durante o chamado ‘Abril Vermelho’, o movimento movimento invadiu ao menos 13 fazendas.

“Se ele não tivesse falado nada, estava tudo certo”, disse o parlamentar ruralista, ao comentar a pergunta feita por Lula para o ministro sobre a razão de o agro não gostar dele (O Estado de S.Paulo, 24/5/23)


Ministro diz que Lula pergunta por que agro não gosta dele

Declaracoes foram feitas durante a entrevista que o ministro concedeu ao Roda Viva na noite desta segunda-feira, 22.  Foto: Reproducao-YouTube-RodaViva

Declarações foram feitas durante entrevista de Carlos Fávaro ao programa Roda Viva, da TV Cultura, na noite desta segunda-

O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, afirmou nesta segunda-feira, 22, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer melhorar a relação com o agronegócio, apesar da tensão entre o setor e a gestão petista. Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, ele disse ainda que é a favor do marco temporal das terras indígenas.

Segundo Fávaro, Lula “sucessivamente pede para estar próximo do agro”. “(O presidente) Quer se aproximar, ele me pergunta por que não gostam dele”, afirmou Fávaro. A relação do governo e do agro tem se deteriorado com a série de invasões de propriedades produtivas pelo Movimento dos Sem Terra (MST).

 

O ministro admitiu que Lula já proferiu “frases fortes” sobre o agro. Recentemente, em evento na Bahia, o petista chamou ruralistas de “fascistas” após o ministro da Agricultura ser desconvidado da Agrishow, em Ribeirão Preto (SP).

Fávaro citou iniciativas de governos passados de Lula, como a regulamentação do uso de transgênicos no Brasil, a criação do Programa Nacional do Biodiesel e a repactuação de um endividamento de 20 anos do setor agropecuário. “Por tudo isso o agronegócio saiu de um patamar e foi para outro muito maior, graças a essa persistência e dedicação do presidente Lula. Então, quando ele toma alguma frase um pouco mais forte, nós temos de respeitar a posição política dele”, disse.

Sobre o episódio da Agrishow, Fávaro afirmou que o ex-presidente da feira, Francisco Matturro, se deixou envolver por uma quebra de protocolo. “Não se percebeu que estava se deixando envolver por questões políticas”, disse o ministro. A ausência de Fávaro e a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro no primeiro dia da principal feira de tecnologia agrícola do País foi motivo de atrito entre o governo e a organização do evento, no início deste mês. “Para mim é caso superado”, disse o ministro.

Questionado sobre ações para pacificar as relações do governo com o agronegócio, o ministro ressaltou que praticamente todas as entidades representativas de classe do setor já foram recebidas no Ministério da Agricultura para informar dificuldades e buscar soluções e políticas públicas. “Avançou muito o diálogo”, disse.

Marco Temporal

O ministro tratou também da demarcação de terras indígenas, que é um tema recorrente na pauta do agronegócio. O caso também está em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF) e irá a julgamento no dia 7 de junho. A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) defende a aprovação do Projeto de Lei 490/2007, chamado de PL do Marco Temporal, que define como terras indígenas as que estavam ocupadas pelos povos tradicionais até 5 de outubro de 1988 – data da Constituição – como forma de se antecipar à Corte.

A proximidade do governo com o MST fragilizou as relações com o agronegócio. Na foto, João Pedro Stedile (centro), liderança dos sem-terra, anda ao lado do vice-presidente Geraldo Alckmin (direita) na IV Feira Nacional da Reforma Agrária.  Foto Taba Benedicto

“Sou a favor do marco temporal, que traz segurança jurídica”, disse Fávaro. Ele se disse convicto de que o STF tem conhecimento das dificuldades da discussão e vai tomar uma “decisão equilibrada, respeitando os dois lados”.

O ministro disse ainda que há necessidade de “espaço” para que os povos indígenas se desenvolvam, supram suas demandas e necessidades. “Vemos indígenas ainda em estados deploráveis em um País de tanta riqueza e tanta fartura. Isso precisa ser corrigido”, afirmou. O ministro ponderou, no entanto, que essa concessão não pode ocorrer “em detrimento de um setor tão importante”, ao se referir à ocupação de terras produtivas.

Para o ministro, a demarcação, caso se inicie, deve começar pelas regiões com maiores conflitos, e é preciso haver o pagamento de uma indenização aos produtores que precisarem deixar alguma propriedade. “É possível fazer isso, precisa ter boa vontade e o governo do presidente Lula tem essa boa vontade”, ressaltou.

Produção

O ministro disse ainda que é possível produzir sem desmatar no Brasil e afirmou que o governo planeja criar linhas de crédito por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para investimento em recuperação de terras degradadas. Fávaro afirmou que até mesmo no Cerrado, onde se concentra a maior parte da agricultura de grãos do País, é possível avançar a agricultura sem desmatar, plantando apenas em áreas degradadas.

Ele ainda condenou a invasão de terras improdutivas. Segundo ele, enquanto o MST pode lançar mão de passeatas, por exemplo, como forma de reivindicação. “É legítimo e faz parte da democracia”, disse. “Agora, invadir terras da Embrapa eu não entendo por que fazer”, completou. Fávaro ainda ressaltou que o movimento também é produtivo e está ligado à agroindústria e à produção de alimentos sustentáveis e orgânicos. “O sonho e a luta pela terra também é legítimo, mas não pode ser de forma desordeira e fora da lei”, disse (Estadão.com, 23/5/23)