Produtores agrícolas são contra greve de caminhoneiros
GREVE CAMINHONEIROS Foto Ueslei Marcelino Reuters
Representante do setor diz que paralisação traz dificuldades não apenas o agro, mas também para o bolso do consumidor
O agronegócio ainda tem as más lembranças do que foi a greve dos caminhoneiros de 2018. Insumos, como ração, não chegando às granjas e a interrupção da saída de animais e de cargas das fazendas.
O resultado foram prejuízos de R$ 3,2 bilhões apenas no setores de aves e de suínos, e a morte de 70 milhões de aves por falta de alimentação. Houve uma paralisação no abastecimento interno e nas exportações.
O agronegócio está sendo cobrado por tudo que acontece, mas o setor é muito grande e diversificado, diz Glauber Silveira, representante da Abramilho, da Câmara Setorial da Soja e da Arefloresta, todas entidades ligadas à produção.
Os efeitos de uma paralisação seriam dramáticos para o agronegócio neste momento, na avaliação dele, também presidente do Sindicato Rural de Campos de Júlio (MT) e ex-presidente da Aprosoja de Mato Grosso.
Para Silveira, parte dos produtores ainda está fazendo a colheita de milho safrinha, enquanto outros já se preparam para o plantio da safra de verão.
É um momento de muita atividade no setor, com trânsito intenso de insumos e da necessidade de diesel. “Essa paralisação joga o país ainda mais para baixo. Não paramos [o agronegócio] nem na pandemia, e mantivemos boa parte da economia em movimento por causa disso”, diz ele.
O setor rodoviário é muito importante para o agronegócio, e os caminhoneiros têm direito de se manifestarem sobre suas causas. Não podem, no entanto, interromper o direito de ir e vir das pessoas, afirma o representante das associações.
Um eventual acirramento dessa paralisação vai dificultar o abastecimento de milho e de soja no mercado, elevando ainda mais os custos das indústrias. Os preços, que já estão altos, pressionando a inflação, ficariam ainda mais elevados, prejudicando os consumidores.
O setor de proteínas, um dos mais afetados na greve anterior, começa a sofrer algumas interferências da paralisação.
Carlos Zanchetta, da Zanchetta Alimentos, empresa localizada em Boituva (SP), relata dificuldades na chegada de insumos vindos do Centro-Oeste. A situação, contudo, começa a ser normalizada, disse à Folha nesta quinta-feira (9).
Para Ricardo Santin, presidente da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal), o setor encontra apenas dificuldades pontuais. Ele cita o exemplo do Paraná, onde estava em reunião com produtores de Maringá (PR) nesta tarde de quinta.
Líder na produção nacional, o estado teve apenas um ponto de dificuldade na circulação de mercadorias. Já no porto de Itajaí, em Santa Catarina, a paralisação foi mais acentuada, segundo ele.
Santin destaca que, desta vez, ao contrário da anterior, os motoristas permitem a passagem de produtos perecíveis pelas barreiras.
Vlamir Brandalizze, da Brandalizze Consulting, afirma que os pontos mais sensíveis seriam os portos de Santos, Paranaguá e Rio Grande, por onde entram e saem os maiores volumes de mercadorias.
Setembro é um período de grande movimento no agro, não só pela saída de produtos exportados, mas também pelo volume importado.
Ao contrário do que ocorreu no ano passado, o período de plantio segue normal neste ano, e um atraso da chegada dos insumos nas lavouras colocaria o melhor período de semeadura em risco. “Seria dramático, uma vez que o país vai plantar uma área recorde nesta safra”, diz Brandalizze.
A entrada de trigo no país atingiu 49 mil toneladas por dia útil neste início de mês, e a de milho, 22 mil. Já a importação de adubo foi de 283 mil toneladas por dia, e a de agroquímicos, 2.224, segundo a Secex (Secretaria de Comércio Exterior).
Para o presidente de uma entidade do agronegócio, que não quis se identificar, essa paralisação é uma briga de lideranças de caminhoneiros e, se continuar, poderá deixar consequências graves não só para o agronegócio, mas também para toda a sociedade.
Consultada, a diretoria da Aprosoja Brasil informou que não tem opinião formada sobre a greve dos caminhoneiros. Já a Aprosoja de Mato Grosso não quis se posicionar sobre o assunto (Folha de S.Paulo, 10/9/21)