29/01/2018

Redução de impostos no exterior afeta Brasil

Marco Stefanini: “Ficou muito mais atraente investir nos Estados Unidos do que no Brasil”

País pode perder investimentos para lugares que diminuem tributação de empresas.

O mundo vive uma onda de cortes na tributação das empresas, que deixa o Brasil cada vez mais isolado no reduzido clube que recolhe alíquotas próximas de 35% sobre o lucro corporativo. Ao lado da Índia, o País está no topo do ranking entre os países do G-20 e do Brics. Com a Venezuela, lidera entre as maiores economias da América Latina.

A disparidade se acentuou no mês passado com a aprovação de reformas tributárias nos EUA e na Argentina. A maior economia do mundo reduziu o Imposto de Renda (IR) das empresas de 35% para 21%. O vizinho e principal sócio do Brasil no Mercosul aprovou corte gradual, que levará a alíquota de 35%, em 2017, para 25% até 2020. 

A elevada tributação reduz a competitividade de companhias brasileiras e diminui a atratividade do País para investimentos estrangeiros diretos, em um cenário de concorrência global por capital.

Na sexta-feira, o presidente Donald Trump usou sua presença no Fórum Econômico Mundial de Davos para vender sua reforma tributária e dizer que os EUA “estão abertos” a negócios. “Nunca houve um melhor momento para contratar, construir, investir e crescer nos Estados Unidos.”

Levantamento realizado pela Ernst & Young para a Confederação Nacional das Indústrias (CNI) revelou que a tendência vai além de EUA e Argentina. Desde 2015, pelo menos mais oito países cortaram alíquotas corporativas: Bélgica, Espanha, França, Itália, Irlanda, Japão, Noruega e Reino Unido. A Holanda apresentou projeto nesse sentido em outubro.

“Ficou muito mais atraente investir nos Estados Unidos do que no Brasil”, disse Marco Stefanini – Foto -, presidente da Stefanini, multinacional brasileira da área de Tecnologia da Informação que está presente em 40 países. Segundo ele, o governo americano não apenas diminuiu a alíquota do IR como criou incentivos adicionais ao investimento. Entre eles está a dedução total e imediata de despesas com a aquisição de bens de capital e ativos intangíveis.

Stefanini disse que sua intenção é reduzir cada vez mais a fatia de seus negócios no Brasil, que hoje representa 50% da operação global da empresa. Dos R$ 200 milhões que o grupo planeja investir neste ano, 70% serão destinados a outros países. Os EUA, que respondem por 20% das atividades da Stefanini, serão um dos principais focos. “Na questão dos impostos, o Brasil está na contramão.” 

Descompasso. A média da alíquota corporativa nos 35 países que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) passou de 32%, no ano 2000, para atuais 24%, mostrou o estudo. “Quando o mundo caminha para alíquotas mais baixas e o Brasil se mantém em 34%, o País reduz sua atratividade para o capital produtivo”, disse Gustavo Carmona, diretor executivo de Tributação Internacional da Ernst & Young e autor do estudo.

Análise de 202 países feita pela Tax Foundation em 2017 indicou que a média da alíquota corporativa era de 23%. Dos 202 países, 167 – o equivalente a 83% – cobravam porcentuais inferiores a 30%. Apenas 35 países cobraram 30% ou mais. Esse grupo diminuiu depois dos cortes nos EUA, Argentina e França. Com eles, o Brasil passou do 15.º para o 12.º lugar entre os que mais cobram impostos de suas empresas.

A elevada tributação não impediu que o País continuasse entre os principais destinos de investimento estrangeiro direto. Mas os cortes nos EUA e na Argentina podem alterar o cenário no longo prazo. Carmona lembrou que as mudanças terão efeito a partir deste ano. “Uma multinacional poderá escolher entre investir no Brasil, e pagar alíquota de 34%, ou na Argentina, que terá 25% a partir de 2020, e exportar de lá para o Brasil.”

“Nós levamos um susto. Não sabíamos que a situação era tão crítica”, disse o diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI, Carlos Abijaodi. “Não estamos dizendo que da noite para o dia o investimento estrangeiro no Brasil vai desaparecer, mas estamos alertando para uma situação que nos levará a uma trajetória de declínio” (O Estado de S.Paulo, 28/1/18)