15/01/2018

Uma vitrine para o café brasileiro na capital do Japão

Uma vitrine para o café brasileiro na capital do Japão

No coração de Ginza, o bairro comercial mais chique de Tóquio, uma cafeteria com o improvável nome de Café Paulista – escrito em português mesmo – chama a atenção. Cafés do Brasil, Colômbia, África, América Central e Ásia estão no cardápio dessa que é uma das mais tradicionais cafeterias da capital japonesa. Mas não foi sempre assim. E daí vem a explicação para um nome tão familiar.

A Café Paulista foi aberta em 1911 por Ryo Mizuno, o empreendedor japonês que trouxe ao Brasil os primeiros imigrantes de seu país para trabalhar em lavouras de café. Foi ele o responsável pelo Kasatu Maru, o primeiro navio com imigrantes japoneses, que aportou em Santos em 1908.

Naqueles anos, conta Katsuhiko Hasegawa, atual dono da Café Paulista, vigorava no Brasil uma política de intervenção no mercado de café – o chamado Convênio de Taubaté – para evitar a queda dos preços devido à superprodução do grão. Além de retenção do café, a estratégia incluía a busca de novos mercados para vender os excedentes do produto brasileiro.

Em entrevista ao Valor, via skype, Hasegawa conta que Mizuno foi, então, incumbido de levar o café brasileiro ao Japão para abrir o mercado do país asiático ao produto. Com esse objetivo, criou uma companhia chamada Café Paulista em 1910. A cafeteria com o mesmo nome seria aberta um ano mais tarde.

Nos primeiros três anos, o café produzido em São Paulo foi doado ao Japão, relata Hasegawa, já que era interesse do governo brasileiro ampliar os clientes para o produto no exterior. Foram, no total, pouco mais de 7 mil sacas de café, no período de três anos, conforme relatos históricos.

"Quando Mizuno tentou vender o café do Brasil, encontrou dificuldades, porque ninguém conhecia café no Japão, todo mundo tomava chá verde", diz Hasegawa. Então, o empresário foi a Paris "para ver como os europeus estavam consumindo café", acrescenta. Visitou o tradicional Café Procope, o mais antigo café de Paris, e na época, a cafeteria mais popular da capital francesa. "Mizuno foi lá ver como os franceses tomavam café e, de certa forma, copiou o estilo francês de cafeteria e trouxe para a Café Paulista".

A cafeteria passou a atrair jornalistas que trabalhavam num periódico localizado nas proximidades, estudantes e pessoas famosas. "Foi um grande sucesso", afirma.

Segundo o atual dono da Café Paulista, a cafeteria ganhou esse nome porque à época de sua fundação o Estado de São Paulo era o maior produtor de café do Brasil. Naquela época, o estabelecimento vendia apenas café brasileiro, diferentemente de hoje.

A Café Paulista entrou na vida da família Hasegawa em 1947, quando Kazue Hasegawa, avô de Katsuhiko Hasegawa, comprou a empresa de Mizuno. "Mizuno estava mais interessado em desenvolver uma colônia japonesa no Brasil, em levar imigrantes, então depois de uma grande terremoto no Japão ele foi para o Brasil", conta o empresário.

Kazue Hasegawa era torrefador de café e trabalhava para Mizuno. Depois dele, o negócio passou a ser gerido por seu filho Hirokazu Hasegawa, hoje com 89 anos. Desde 1988, a operação é tocada por Katsuhiko, da terceira geração da família, que viveu no Brasil por um ano, em 1983, graças a um programa de intercâmbio da Sophia University, instituição fundada por jesuítas no Japão, e da PUC-RS.

A Café Paulista sempre funcionou em Ginza, ainda que em números diferentes. O nome do estabelecimento, no entanto, mudou temporariamente durante a Segunda Guerra Mundial.

"Durante a Segunda Guerra, como o Brasil estava do lado dos aliados, e os japoneses do lado da Itália e da Alemanha, o país se tornou um inimigo para o Japão. Por isso, o nome Café Paulista foi banido pelo governo militar japonês", conta Hasegawa. Então, a empresa passou a se chamar Nitto Coffee, que significa Japan Coffee, explica. Mas depois que o país foi derrotado no conflito, o nome Café Paulista passou a ser usado novamente. E, desde então, segue quase como uma vitrine permanente para o café do Brasil (Assessoria de Comunicação, 12/1/18)

 


Empresa foca os orgânicos e adquire 60% do volume de produtores do Brasil

A cada dia os baristas da Café Paulista servem, em média, 700 xícaras da bebida, aos clientes que passam pela região de Ginza, em Tóquio. As origens são várias, mas o café brasileiro predomina na cafeteria, onde cada xícara é vendida por US$ 5,00.

Em 2017, a empresa, que prioriza os cafés orgânicos, comprou 600 toneladas do grão, e 60% desse volume foi proveniente do Brasil, segundo Katsuhiko Hasegawa, CEO da empresa. Neste ano, diz ele, a previsão é adquirir uma quantia 10% maior das várias regiões de produção, tais como Brasil, Colômbia, África, América Central e Ásia.

Além da cafeteria, a empresa também vende cafés no varejo japonês e para redes de hotéis, com a marca Nitto Coffee. De acordo com Hasegawa, 99% dos cafés comercializados pela Café Paulista são da espécie arábica e apenas 1% do volume é de robusta.

O produtor Cláudio Carneiro Pinto, de Carmo de Minas, na região sul de Minas Gerais, é um dos 16 cafeicultores brasileiros que vendem o grão para a japonesa Café Paulista. "Todo o café que produzo é orgânico", diz Carneiro, de 77 anos, que está no negócio desde 1960, quando sua mãe iniciou o plantio de café. Ele fornece para a Café Paulista há 10 anos.

Em 2017, o produtor vendeu 100 sacas para a empresa japonesa, de um total de cerca de 700 sacas colhidas, com certificado de orgânico conferido pelo IBD Certificações A certificação garante que o café é produzido sem uso de agroquímicos.

Todos os anos, o dono da Café Paulista visita as propriedades produtoras de onde compra café no Brasil, e a de Carneiro é uma delas. "Ele vem todo ano e sempre me convida para ir ao Japão", conta o produtor, que até agora resistiu aos convites.

Membro do conselho diretor da Associação Brasileira de Cafés Especiais, Adolfo Vieira Ferreira, vende para a Café Paulista há mais de dez anos. O café especial produzido em Monte Belo, também no sul de Minas, é convencional e certificado pela BSCA e pela Utz, segundo o produtor.

Ferreira, que há 10 anos visita a torrefação e a cafeteria da Café Paulista no Japão, vende cerca de 320 sacas de café por ano para a empresa. A maior parte desse volume é de cafés com pontuação 85, conforme os critérios do protocolo de avaliação da Associação Americana de Cafés Especiais. Há também, diz, microlotes com pontuação acima de 85, que são ainda mais valorizados.

Além de Minas, a Café Paulista importa cafés de regiões produtoras de São Paulo e Espírito Santo, segundo Katsuhiko Hasegawa (Assessoria de Comunicação, 12/1/18)